Crônica

ECOOOOOOOO


O céu estava limpo, sem anunciação de chuva _ é fevereiro, período chuvoso no cerrado do centro-oeste _ as estrelas estavam ocupando seu lugar e exercendo seu papel com um brilho impecável. Era uma noite especial para todos, estávamos comemorando o dia da Mulher e do Homem Presbiterianos, na verdade, tínhamos preparado um gostoso petisco para após a cerimônia do culto; para alguns seria uma surpresa para outros o fato já tinha sido revelado. Sem problema algum quanto à revelação, contanto que teríamos alguns momentos agradáveis.

Tudo saia exatamente como programado, o pastor havia transmitido um lindo recado, já tínhamos cantado bastante, alguns bem afinadinhos outros nem tanto, mas a cantoria saiu perfeita. A ceia relembrando o momento lindo que Jesus instituiu com os seus discípulos, também tinha sido realizada; essa é uma das partes mais lindas do ritual; somos levados a relembrá-lo uma vez por mês. Quem participa sabe que faz bem e traz grande esperança aos corações.

Parecia tudo perfeito durante a festa até que num momento descontraído e em meio ao burburinho surge uma conversa sem sentido, ou melhor, sem convencimento. “Não participo da Escola Dominical porque estou muito cansada” _ impressione-se, mas essa fala não é exclusiva de apenas uma mulher e nem tão pouco referente somente às atividades da igreja; é um eeeeeeccccccccccccooooooooo de grandes proporções _ perpassa por todas as áreas ­_ como cansada se tem menos de quarenta anos? Portanto, se julga com vigor suficiente para cuidar de todas as atividades. Até porque, o que as mulheres decidiram, se não ela; fizeram por ela, algumas décadas atrás quando queimaram os sutiãs na praça _ na verdade não houve Bra-Burning _ que teríamos uma vida profissional; seríamos mães (logo, cuidaríamos dos nossos rebentos) e teríamos um corpo invejável, magro e esbelto e ainda nos incumbe o cuidado dos maridos, porque também os temos. Somos essa quase super mulher (que nos faz reportar àquele seriado, não tão “ingênuo” da década de 70 _ “A Mulher Maravilha”; claro que muitas delas não reconhecem essa época, quem sabe, releva-se?). Ouvir uma fala dessa é pra deixar qualquer uma da mesma espécie e da mesma condição, sem fala e contrariada; como pode ser tão fraca? que não pode resolver uma situação aparentemente tão simples? mas que tem perturbado aquelas que não estão preparadas para o século XXI; então pergunto: o que fazer com as desavisadas? como fazer com que ouçam?

Talvez tivéssemos várias vazões para justificar tal momento estuporado _ mental, espiritual e físico _ e enumerássemos alguns que subjuguem o corpo e a consciência. O tempo passado na utilização da mídia áudio-visual sem critério de seleção quanto ao programa, dos quais se percebe o anúncio, de forma subliminar, de que a raça feminina está aí para sobrepujar a masculina. Podemos balbuciar a privação da mídia escrita, um livro versus um acessório, sem titubear, na rixa se ganha o acessório.

E ainda a preocupação de esculturar o corpo; afinal, somos mais narcisistas do que em qualquer outra época. Ah, estava meio que abstraída; mas temos que concordar sobre a cútis; sem ou com bisturi, creme importado ou não; contanto que pareçamos como bebês, ainda que estejamos já beirando os oitenta _ nada contra aquelas que chegaram lá, também almejo tal posição.

Bem; nesse sentido, há razão de sobra para se cansar, para estar deprimida, mal amada e ainda infeliz, pois, o oposto do homem não tem conseguido conciliar todos os papéis. O corpo tem gritado por help, my God. A raça feminina está a ponto de sucumbir...

Talvez fosse preciso providenciar um megafone numa altura suficiente a todas às desavisadas, de que estamos andando a passos largos, pra não dizer correndo em alta velocidade, pois o mundo da informação tem bombardeado e tiranizado nossa visão e audição; criando um vácuo gigantesco no coração; lugar de onde provem toda fonte de vida; lembremos-nos e ouçamos o sábio Salomão: “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida.”

As estrelas no céu continuaram brilhando ....


Maria Cunha